segunda-feira, 10 de maio de 2010

Ode à camiseta.

- Hoje vai ser uma merda.

Foi o que eu rapidamente disse logo após olhar para o meu armário. Apenas uma camiseta limpa, uma camiseta. E uma camiseta que eu particularmente odeio. Acho que a minha mãe que me deu em algum natal, Bar Mitzvá ou dia do carteiro, algum dia desses. Não joguei fora por puro respeito (Ou talvez preguiça, provavelmente preguiça.) Incrível como jogar algo fora, às vezes necessita de uma quantidade de trabalho ainda maior do que adquirir alguma coisa. E Essa específica camiseta consegue reunir em um só objeto costurado todas as coisas que realmente me irritam no universo. Comecemos pelo princípio, bem no princípio. 

Eu me considero uma pessoa um tanto excêntrica. Talvez não seja. Ou melhor, adoraria não ser. Mas no final, acabo sendo. Se eu saio de casa desconfortável, é desconfortável mesmo. Se qualquer peça de roupa, ou acessório  parecerem o mínimo possível não estar no lugar certo, vou ficar "sentindo" esse acessório constantemente, um desconforto fora do comum. Não que use algum acessório, até relógios me perturbam. E falando disso, porque raios alguém precisa saber das horas? Todo pessoa que precisa saber que horas são, não é interessante o bastante para realmente entender as horas. Mas resumindo, se qualquer peça de roupa ou qualquer coisa estiver me incomodando, vai me incomodar eternamente. Sou obrigado a voltar pra casa e trocar de roupa. E Se não tenho nenhuma outra roupa, fico por lá. São raras as vezes que sair de casa realmente vale a pena mesmo. Mas essa camisa não só incomoda, ela incomoda do jeito que mais poderia incomodar. Ela é muito curta, chega até o final se eu estiver de pé (pelo menos), mas quando o cara inocentemente se senta, aquela droga fica indo pra cima deixando aquele pequeno vão costas/bunda aparecendo. Pô sabem como é não?  Hitler devia estar sempre com uma droga de uma camisa curta.

Retornando ao recente tópico da excentricidade relacionada à minha pessoa. Eu possuo uma rara condição de pele (Diagnosticado por mim, na verdade pode ser qualquer outra coisa) que realmente consegue piorar as coisas. Eu imagino que seja relacionado a algum tipo de tecido e essa camiseta só pode ser desse tecido, claro. Quando o ambiente atinge certa temperatura, um tanto elevada. Desculpem, mas eu não sei exatamente quantos graus célsius, fico devendo esse detalhe. Bom, quando atinge essa temperatura elevada, eu não simplesmente sinto calor como todas as pessoas, além disso, eu sinto uma sensação de “coceira interna” terrível, que só poderia ser classificada por mim como “Um milhão de mini agulhas picando todo o meu corpo a cada 0,5 segundo”. Qualquer caminhada vira praticamente um maldito passeio na Disney.

Então, eu já falei sobre o tamanho e o tecido. Agora vamos nos aventurar pela identidade visual da camiseta. Começando pela cor. Não é uma cor fácil, não é uma cor simpática. A cor é como aquele seu velho tio-avô que até hoje odeia negros, índios e comunistas comedores de criancinhas. Pense em laranja. Certo, não tem absolutamente nada a ver com laranja, mas laranja é a minha cor preferida. A cor em questão é como o total oposto do laranja, é o lado não-laranja da força. É um roxo beterraba tão agressivo pros olhos que chega a doer, mas fechar os olhos não adianta nada. Fechar os olhos é simplesmente convidar o roxo a passear pelos cantos mais obscuros da sua mente. E quanto à estampa? Bom, a estampa. São aquelas estampas que todos conhecem bem, estão por todos os lados. São infinitamente piores que canetas BIC, o google ou a Rotary. São aquelas estampas desse tipo.

- I was born in 1961

Bom, frases que não fazem o menor sentido, em inglês claro. Acompanhados de anos totalmente alheios a todo mundo, onde não aconteceu absolutamente nada relevante para ninguém. Por favor, tem que ser algum tipo de código secreto. Senão a humanidade é simplesmente muito idiota.

                Após um grande período de balancear perdas e ganhos se eu não saísse de casa hoje, acabei saindo. Tinha que sair na verdade. Depois de dois anos, ia dar mais um passo para resolver minha situação com o exército brasileiro. Dois anos. Não é pouco tempo para se enrolar a justiça, mas é um tempo razoavelmente aceitável. Já havia sido dispensado do exército há mais de um ano, em uma cena mais ou menos assim.

                Primeira fase da apresentação.

- Abre a boca

Abri a boca.

- Quer servir?

- Não.

- Vai embora.

Senti então um misto de alívio e rejeição. Acho que é bem compreensível. Por mais que eu não quisesse de jeito nenhum servir o exército, eles tinham que me querer! Não posso ser eu o rejeitado. Todo mundo pensa assim. Ninguém quer ser rejeitado, mas mal podem esperar para rejeitar. Esse simples fator que realmente complica todo relacionamento humano. Tudo bem, não é só esse. São muitos outros também.

Enfim saí de casa, munido de patriotismo da cabeça aos pés, praticamente um poeta modernista (com a minha fiel camisa roxa é claro). Um amigo meu tinha vindo me dar uma carona e me acompanhar durante todo o processo militar. Fica a pergunta. Porque raios alguém ia de livre e espontânea vontade querer fazer isso? Eu paguei pra ele? Não, ele simplesmente não tinha nada para fazer. Não pode ficar mais simples do que isso. 

            No carro, já tinha puxado minha camiseta para baixo umas cinco ou seis vezes, enquanto meu amigo contava sobre o seu olho eternamente dilatado.

- Tá vendo o meu olho? Como é que tá?

             A pupila dele era praticamente o olho inteiro, parecia um vampiro de filmes B.

- Normal. Sei lá.

Pode parecer uma simples falta de tato, mas eu realmente nunca conseguiria distinguir se o olho de qualquer pessoa está minimamente diferente ou não. Pra mim, impossível.  Como diria Djavan, “mais fácil aprender japonês em braile”.

A junta militar não era assim tão longe, mas era certamente um lugar extremamente irritante. Digamos o “centro” da cidade, onde se concentra todo o povo, os malucos, os mendigos e os mendigos malucos. Transeunte atrás de transeunte, transitando por aquelas vias imersas em humanidade. Cheiro de gente, até o maldito gosto. Isso sim é viver em sociedade. E no meio de tudo isso, eu só pude chegar à conclusão que todas aquelas camisas eram infinitamente mais agradáveis do que a minha.

Ainda sem pressa pra cumprir minhas obrigações com o governo, escolhi pelo mais sensato. Fui com meu amigo até uma loja de quadrinhos que fica ali por perto.  A loja não se limita só a quadrinhos, tem outras coisas como “bottons”, imãs, e claro, camisetas. E estar usando aquela droga de camiseta roxa praticamente fui obrigado a passear pelas camisetas da loja. Olhei as camisas sem compromisso até que tive um momento mágico. O tempo ficou mais lento, as cores mais vivas, tinha até uma maldita trilha sonora. Simplesmente mágico. Havia enfim encontrado uma camiseta que eu sempre quis ter, mais do que uma camisa, uma ideia. Uma camiseta do “Flash”!  Como todos sabem, super-heróis da DC tem uma terrível verba para uniformes, porque você pega uma maldita camisa verde com um adesivo de uma logo mais ou menos e é isso. Você É o “Lanterna Verde”. Claro, se quiser um pouco mais de verossimilhança é só acrescentar umas calças colantes, ai sim, vem até com os superpoderes. Agora tenta se vestir como o “Homem-Aranha” ou o “Homem de Ferro”. Enfim, quem sabe aquela camisa ia me trazer conforto, autoconfiança, ou até supervelocidade mesmo. Como eu disse, era muito mais que uma camisa. Era um raio fúlgido de esperança, um berço de confiança, uma droga de uma camiseta de super-herói. O resultado de tudo isso, como já se era de imaginar, eu comprei a camiseta. Meu amigo comprou uma do Batman e começou um plano de fazer uma pequena Liga da Justiça. É claro.

“Obviamente ele trocou de camiseta o mais rápido que pôde.” Todos devem ter passado por esse simples raciocínio, mas creio que é um pouco mais complicado do que isso. Eu tinha algo a cumprir com aquela camiseta roxa. Não vim até aqui com essa maldita beterraba por nada, no mínimo ia acabar o que eu vim fazer. Lá fomos nós rumo à junta militar.  Logo, o calor incrivelmente seco se entrelaçou com o tecido da camiseta. Uma união perfeita. Era como uma cobra finalmente envolvendo a presa, uma mulher enfim agarrando um marido, qualquer pessoa encontrando outra pessoa que preste. Meu destino estava selado. Não tardou nem um pouco para que o efeito antes mencionado começasse. Praticamente dava pra ouvir as crianças robô cantando “Little World” com aqueles assustadores sorrisos mecânicos. Era uma maldita festa.

Com a minha incrível inata habilidade de escolher exatamente a melhor hora para fazer todas as coisas, eu cheguei à junta logo no dia que todos os orgulhosos jovens que completaram 18 anos resolveram se alistar no maldito serviço militar. Teria que escutar aquela droga de música por sabe-se-lá-quanto-tempo. Como de praxe, extremamente entediado e agoniado em um fila gigantesca, foi impossível para eu calar a boca. Ninguém mais falava naquela maldita fila, todos me olhavam falar sobre temas que mais alheios à situação, impossível. Julgando o máximo que podiam enquanto esperavam, meio inseguros, a sua vez de adentrar no sistema. Chega esse momento para todos nós, estou adiando e odiando o meu o máximo possível.  Olhei para dentro da junta e vi uma ilustração que me fez realmente pensar por um momento, porque só podia ser o Olavo Bilac. Refleti um pouco mais. E é claro que era Olavo Bilac! Nosso velho parnasiano necrófilo preferido. Logo lembrei que todo esse ritual tão querido pelos jovens brasileiros era culpa dele. Um poeta aleatório simplesmente instituiu um sistema de alistamento obrigatório que dura até hoje. Obrigado Olavo. Obrigado por colocar um caminho na frente de tantos jovens perdidos. De repente fui atingido por uma idéia:

- Que você acha da gente fazer uma camiseta, tipo aquela ilustração do “Tio Sam” apontando pra frente “I Want You”...

Imitei o velho “Tio Sam”.

-... Mas em vez do “Tio Sam”, com o Olavo Bilac! Ia ficar muito genial.

- Mas “I Want You” não dá. Tem que nacionalizar isso ai. Que tal “Quero tu”?

            Olhei para a cara dele realmente fascinado, como se atingido por um raio de genialidade.

- Temos uma ótima idéia.

Continuei a discorrer sobre os mais diversos temas quando em um momento me encontrava no meio de uma interessante anedota:

- Então lembra aquele inimigo do “Homem-Aranha”, o “Carnificina”?

- Sim, lembro sim.

- Então, uma vez o simbionte saiu dele e foi parar adivinha aonde?

- No “Homem-Aranha”?

- No “Surfista Prateado” cara! Ele estava tranquilamente passeando pela terra, tirando umas férias de arauto do “Galactus” e BAM!

            Quando finalmente fui chamado.

- Próximo!

Tentei prestar atenção no que a atendente falava (realmente tentei), mas o tempo inteiro simplesmente ficava olhando para aquela ilustração do velho Olavo e pensando na  ideia da camiseta.

- Volte aqui dia 19 para fazer o juramento à bandeira. Próximo!

Claro, não estava terminado. Simplesmente avancei para a próxima etapa neste intrincado processo. Você não ganhou ainda Olavo, até jurar meu amor à pátria, tenho minha liberdade. Saí dali com uma pequena sensação de dever cumprido. Tirei a maldita camiseta, estava na hora de ser o “Flash” um pouquinho.

2 comentários:

  1. que que vc tem contra camisas roxas? me dá ela! e se a do flash for curta,me dá ela tbm haha =*

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  2. roxo é minha cor favorita ¬¬
    haha
    =D

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